Reflexão, emoção e engajamento da comunidade
acadêmica marcaram a 1ª Semana Internacional das Humanidades, realizada pelo
Centro Universitário Univates, em Lajeado. A atividade contou com parceiros,
entre os quais a PASUNE (Pastoral Universitária Ecumênica), CECA (Centro
Ecumênico de Capacitação e Assessoria), COMIN (Conselho de Missão entre
Indígenas), FUMEC ALC (Fundação Universal dos Estudantes Cristãos – América
Latina e Caribe) e a REJU Sul (Rede Ecumênica da Juventude – regional Sul). A iniciativa
transcorreu entre os dias 7 e 11 de abril e contou com cinco palestras de
notáveis personalidades. As propostas contribuíram para uma visão crítica da
atualidade a partir de diferentes abordagens sobre Direitos Humanos. A
qualidade do evento e a expectativa de público foram superadas pela organização.
No total, cerca de mil e quinhentas pessoas, entre alunos, professores e
comunidade em geral, participaram da Semana Internacional das Humanidades.
A abertura oficial do evento ocorreu no dia 7. A mesa foi composta pela
coordenadora da atividade e do curso de História da Univates, professora
Maribel Girelli; coordenador da área de Humanidades, professor Daniel Granada;
diretora do Centro de Ciências Humanas e Jurídicas, professora Fernanda Brod; e
reitor e pró-reitor de Pesquisa, Extensão e Pós-Graduação, professor Carlos
Cyrne. Fernanda sintetizou em seu pronunciamento a importância da realização do
evento em âmbito acadêmico. “A Semana Internacional das Humanidades vem com a
proposta de promover discussões acerca de temas que vão além da formação. A
área de humanidades está presente em todas as formações, pois queremos formar
cidadãos, muito além da formação acadêmica”, disse.
A Semana Internacional das Humanidades foi mais um passo para a consolidação da
Pasune e da Reju-Sul como parceiras da instituição. Alunas da Univates e também
integrantes das organizações ecumênicas, Edoarda Sopelsa Scherer e Karen Daniela
Pires colaboraram nos preparativos do evento, principalmente na indicação e
recepção dos conferencistas. Facilitadora da Reju-Sul e coordenadora da Pasune,
Edoarda destaca que a realização do evento foi importante pois cumpriu “o papel
de enaltecer algumas das principais pautas e tensões em relação aos Direitos Humanos
no Brasil, na América Latina e Caribe. O olhar da Acadêmica, em diálogo com
pessoas militantes e estudiosos de distintos contextos, possibilita rever
conceitos e criticar uma verdade que nos é colocada como uma realidade”.
Memória,
Justiça e Verdade
A
palestra do dia 7 foi proferida pelo representante
civil da Comissão da Verdade, Anivaldo Padilha. Além de apresentar o trabalho
da organização, que investiga casos de violação de direitos humanos durante a
Ditadura Civil-Militar no Brasil, ele relatou o processo de exílio pelo qual
passou durante 13 anos. “Atravessei a fronteira do Brasil com o Uruguai. Senti
o alívio de estar vivo, mas surgiu a grande preocupação: de que maneira eu iria
reconstruir a minha vida? Optei por transformar o exílio em outra frente de
luta”, contou. Segundo Padilha, o Brasil vive um momento especial com a
democracia, embora defenda que o autoritarismo seja um dos resquícios da
ditadura. “Temos muito a avançar e cabe a essa geração assumir estas
bandeiras”, destacou.
Direitos
Humanos: Universalismo x Culturalismo
O
doutorando da Universidade Metodista de São Paulo, Elton Vinícius Sadao Tada, palestrou
no dia 8. Ao mesclar conteúdo e teorias filosóficas, Tada provocou reflexões na
plateia. “Você vai pensar nos direitos daqueles que você considera humanos. O
que a gente não conhece, a gente finge que não existe”, ressaltou. O
palestrante propôs que os Direitos Humanos sejam repensados a partir das
perspectivas do universalismo junto ao culturalismo, mesmo que sejam
apresentados de maneira oposta, deve-se buscar este equilíbrio. A primeira tem
a ver com questões ligadas à justiça e à racionalidade; já a segunda pressupõe
o entendimento e respeito à cultura do outro sujeito.
Cuba
e Colômbia: Olhares sobre Direitos Humanos na América Latina e no Caribe
Amplas e impactantes abordagens de Direitos Humanos em Cuba e
na Colômbia marcaram a palestra do dia 9.
O contexto cubano foi explicado pela presidente da FUMEC ALC
- Cuba, Sarahi Garcia Gomez; e o colombiano pelo mestre em Teologia e mestrando
em Ciências Políticas, Maurício Avilez Alvarez. Sarahi destacou os avanços da
ilha socialista em termos socioeconômicos, abertura de diálogo do governo com a
população e as mudanças ocorridas após a Revolução Cubana de 1959. O movimento
se notabilizou pela implantação de uma série de
programas assistencialistas, sociais e econômicos, alfabetização da população e
acesso à saúde universal.
Maurício apresentou o contexto histórico da política colombiana e das
guerrilhas e relatou suas experiências como militante social. Apontou
semelhanças e divergências do contexto colombiano com o atual panorama
político-social brasileiro. Resquícios da ditadura também devem ser
reconhecidos, atualmente, como as recentes militarizações das favelas do Rio de
Janeiro. Está exilado no Brasil há oito anos.
Defesa
dos Territórios x Garantia de Direitos
A conferência do dia 10 teve à frente o advogado e representante do MST no Rio
Grande do Sul, Diego Vedovatto; representante da Liderança Indígena Kaingang, Francisco
Rokã dos Santos; e o líder do movimento quilombola, Onir Araújo. A mediação das
falas foi feita pelo professor doutor Luis Laroque.
Na noite, foram
abordados temas relativos à defesa de territórios, sendo ressaltado e
questionado o conceito da propriedade, e, como a terra é cedida e para quem são
determinados o uso e gozo, ao longo da história brasileira, em desfavor à
presença indígena e quilombola, assim como as demandas da reforma agrária. Com
intuito de desmistificar a articulação dos movimentos atuais houve relatos das
experiências e quais os desafios que permanecem junto à função social da terra.
A
maioridade penal
O
encerramento do evento foi no dia 11 com palestra do professor de Filosofia da
Universidade Metodista de São Paulo, Daniel Souza, e do Promotor de Justiça e
professor de Direito da Univates, André Prediger.
Ambos manifestaram posição contrária à aprovação da maioridade penal para 16
anos de idade. Prediger destacou que diante do caos do sistema penitenciário
brasileiro é impossível encarcerar um adolescente que comete atos infracionais.
O Dr. André defende a aplicabilidade do Estatuto da Criança e do Adolescente,
tanto na garantia de direitos como nas punições previstas. Para o promotor, a violência
só será amenizada quando uma questão-chave for solucionada. “Enquanto não
erradicarmos o problema de drogadição, esquece resolver a violência no país”,
ressaltou.
Souza conduziu sua explanação a partir do pressuposto do jovem como sujeito de
direitos. Ele chamou a atenção para o extermínio de jovens no Brasil a partir
de dados estatísticos. Levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) mostra que mais da metade (53%) dos homicídios de 2010 no
Brasil atingiram jovens, sendo 75% negros e 91% homens, com idade entre 20 e 25
anos. “O cerne da questão é a violência e o extermínio de jovens. Punir
simplesmente é vingança, tem que haver políticas sociais. É preciso também
superar o mito de que adolescente não é punido”, frisou o professor. Para
Souza, os horizontes em relação ao tema da maioridade penal abrangem a
efetividade das políticas sociais para garantia de direitos e o cumprimento das
medidas determinadas pelo Eca.
Texto: Camila Pires
Fotos: Fernanda S. Scherer; Tiago Bortolotto.